terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Casal Martin como modelo de Santidade

Pela primeira vez, com a beatificação dos esposos Martin – pais de Santa Teresinha do Menino Jesus –, a Igreja estabeleceu que a comemoração destes esposos seja no dia do seu matrimônio, e não no de seu falecimento, como de costume.



«Com isso entendo que a Igreja deseja assinalar a importância da união matrimonial como caminho de santificação e fonte de elevação da sociedade», revela à Zenit a professora Eva Carlota Rava, argentina estabelecida em Roma, onde leciona teologia espiritual, na Pontifícia Universidade Lateranense.
Esta docente, que esteve no santuário de Lisieux para a beatificação de Louis Martin e de Zélie Guérin, declara que os pais de Teresinha foram declarados beatos não por serem pais de uma santa, mas por si mesmos e suas virtudes heróicas.
O dia da beatificação coincidiu com o DOMUND, Domingo Mundial das Missões, e com o 10º aniversário da proclamação de Santa Teresinha de Lisieux como Doutora da Igreja por João Paulo II.
É apenas a segunda vez que um casal é elevado aos altares: os primeiros foram Luigi Beltrami Quatrocchi e Maria Corsini.


– O que significa a beatificação dos pais de uma jovem santa?– Rava: Antes de tudo, é preciso esclarecer, como já foi feito em várias ocasiões, que o fundamento da beatificação dos pais da Teresinha não é a santidade de sua filha, mas as virtudes heróicas que eles viveram em sua vida de esposos e pais.
Contudo, a beatificação dos esposos Martin manifesta a importância que tem o ambiente familiar e a concreta educação dada para a formação dos filhos, educação integral selada pela vida da fé, ensinada sem dúvida com a palavra, mas sobretudo com o exemplo cotidiano. Se Teresinha é, como disse Pio XI, «a maior santa dos tempos modernos», isto se explica em parte pelo pai e pela mãe extraordinários que ela teve.
– Você esteve em Lisieux no dia da beatificação. O que destacaria daquele ambiente festivo em comparação com outras beatificações às que assistiu?
– Rava: Tive a graça de poder ir a Lisieux para a beatificação e creio que a alegria desse dia permanecerá para sempre dentro de quem assiste a ela. Ainda que eu tenha participado de outras beatificações, foram sempre em Roma. É a primeira vez que posso assistir a uma no lugar de origem do beato e isso tornou a beatificação mais próxima. O que mais me impressionou foi o clima tão familiar desse dia: havia pessoas de muitos diferentes lugares e continentes, não só da Europa, mas também da África e da Ásia, unidos todos pela comum devoção a Teresinha e a seus pais, assim como muita gente jovem e casais com seus filhos. Era como se fosse a festa de uma mesma e grande família. A isso se acrescentou que foi um dia radiante, realmente primaveral, como Teresinha teria desejado.
– Por que não há mais santos leigos e casados?
– Raiva: Nos primeiros séculos da Igreja, havia leigos, jovens de diferentes profissões, famílias reconhecidas, como Santa Cecília, seu esposo Valeriano e seu cunhado, ou São Vitálio e sua esposa Santa Valéria, com seus filhos Gervasio e Protasio, mártires.
Mas com o transcurso dos séculos, ainda que a santidade sempre tenha sido uma vocação universal, na prática pastoral se privilegiou a vida retirada do mundo, a prática dos conselhos evangélicos de castidade, pobreza e obediência e a profissão dos mesmos como estado de perfeição.
O leigo, na medida em que está imerso no mundo e tem obrigações de caráter temporal, pareceu relegado a um cristianismo menos exigente e comprometido.
Na história da espiritualidade, deve-se esperar São Francisco de Sales e depois a própria Santa Teresinha para que na ordem pastoral a santidade seja cada vez mais um chamado universal dirigido a todos e acessível a todos. Essa é a «novidade» do Vaticano II.
A partir do pontificado de João Paulo II, cada vez mais a Igreja se interessou em promover as causas dos leigos que viveram sua fé cristã assumindo de forma heróica todos os seus compromissos temporais. Creio que isso explica em parte os poucos santos ou beatos leigos.
– Que influência positiva pode ter o modelo do casal Martin, os pais de Santa Teresinha de Lisieux?
– Rava: Em geral, os beatos e santos são recordados na liturgia no dia de sua morte. Pela primeira vez, com a beatificação dos esposos Martin, a Igreja estabeleceu que a comemoração destes esposos seja não no dia do seu falecimento, mas no do seu matrimônio. Com isso, entendo que a Igreja deseja assinalar a importância da união matrimonial como caminho de santificação e fonte de elevação da sociedade.
Ainda que os Martin vivessem em um período histórico e em circunstâncias muito diferentes das nossas, sua experiência nos serve de exemplo em muitos aspectos.
Eles nos ensinam antes de tudo a verdade das palavras de Jesus: «Buscai o reino de Deus e sua justiça e tudo o mais vos será acrescentado». Com efeito, conheceram a felicidade de um amor cristão esponsal e familiar generoso e profundo e experimentaram a fortaleza necessária para enfrentar todos os sacrifícios. Ainda que sofressem a perda de 4 filhos pequenos, as dificuldades e exigências de um trabalho indispensável para sustentar a família, e graves enfermidades – ela morreu de câncer aos 46 anos e seu esposo, já viúvo, padeceu de arteriosclerose cerebral –, sempre prevaleceu o amor, a confiança e a gratidão entre eles e com Deus.
Também nos serve de exemplo o modo como souberam conciliar e encarar as exigências do trabalho muitas vezes esgotante, com as da família, educando com amorosa e firme dedicação cada um de seus filhos e encontrando na prática religiosa alento para superar todos os obstáculos.
Os esposos Martin mostram também que a família não é um âmbito fechado sobre si mesmo, mas aberto aos demais. A todos os que entraram em contato com eles, manifestaram solicitude e ajuda: as operárias que trabalhavam para a empresa familiar do «ponto de Alençon», as domésticas, os pobres da cidade... Deram também testemunho de seu espírito cristão, vivendo com patriotismo, mas sem ódios, e com compaixão os duros momentos da guerra franco-alemã quando teve por cenário Alençon e seus arredores.
O casal Luis Martin e Zelia Guérin pode dar luz e força aos esposos e pais cristãos, para fazer de sua vida matrimonial uma fonte de alegria e um caminho para santificar-se santificando. Dão testemunho que a família cristã, quando está animada pelo amor recíproco, é o âmbito onde cada um – pais e filhos – pode crescer e desenvolver-se até alcançar a santidade e oferecer com isso uma contribuição insubstituível à sociedade e à Igreja.

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